A organização política do matriarcado Afrikano


 O intelectual senegalês Cheick Anta Diop refletiu sobre como o matriarcado como instituição originária de um modelo social “do Sul”, muito presente na África desde os tempos mais remotos. Para ele, o matriarcado toma forma enquanto uma configuração social caracterizada pela divisão de poderes entre os sexos, uma assembleia de homens e outra de mulheres, havendo uma preponderância de mando de mulheres, por seu papel dentro da economia, argumento que é trabalhado a partir do elemento da agricultura, portanto, há uma divisão de poderes entre os sexos, o poder político partilhado entre homens e mulheres, de acordo com suas competências dentro da sociedade. A maior proeminência das mulheres no “regime de matriarcado” é relacionada com alguns fatores: um deles é a transmissão da herança e o segundo é o papel na economia, sobretudo pela importância fundamental na agricultura. O matriarcado não seria uma imposição das mulheres sobre os homens, e sim um “harmonioso dualismo” aceito pelos homens como “o melhor caminho para a construção de uma sociedade sedentária em que cada um e todos os membros podem se desenvolver plenamente através de atividades que os conectam com sua natureza psicológica.”

Desenvolvendo sua tese sobre a “Unidade Cultural Africana”, Diop confrontou os modelos de organização social indo-europeia e Africana, tendo como base o status das mulheres, sistemas de herança, dotes e afiliação com a realeza. Para ele, as culturas do “Norte” indo-europeias negaram os direitos das mulheres e as subjugaram sob as instituições privadas da família patriarcal. O patriarcado do norte mantinha as mulheres sob domínio, confinando-as ao lar e negando participação pública e no poder. Neste sistema, o marido ou pai tinha o direito à vida e a morte da mulher o casamento compunha o controle patriarcal, caracterizado pelo dote.

Em contraste, a cultura matriarcal do Sul, caracterizada pelo sistema agrícola e pelo sistema funerário, as mulheres vinham na frente dos maridos. Elas eram as senhoras da casa e as guardiãs da comida. As mulheres eram agricultoras, os homens caçadores. O poder da mulher baseava-se na importância do papel econômico. O Sistema era também caracterizado pelo forte laço entre irmão e irmã. Os ritos funerários também prescreviam o retorno do corpo da esposa a sua terra natal e indicavam compensações para a perda de uma mulher.


Este sistema matriarcal do Sul foi marcado pela sacralidade da mãe sua autoridade ilimitada. Há muitas artes que evocam o poder da mãe, ritualizam o matricentrismo: mãe e filho, ‘o vínculo de amor mais próximo’. Este é o espírito da maternidade comumente simbolizada nas religiões africanas. De forma geral, como conceito nas religiões africanas, a mãe é que dá a seus filhos, e à sociedade como um todo, o “pote da prosperidade”. A mãe também dá o pote de segredos, mistérios, magias, conhecimento sagrado e poder espiritual.

A África, como representante do matriarcado do Sul, valorizava a família matriarcal, estado territorial, a emancipação das mulheres na vida doméstica, o ideal de paz e justiça, divindade e otimismo, em que a ética moral era baseada no coletivismo social. Enquanto o Norte, exemplificado pelas culturas ariana, grega e romana, valorizava a família patriarcal, a cidade-estado, a moral e solidão material. A culpa, o pecado original e o pessimismo modelam sua moral ética que é baseada no individualismo

Para comprovar sua teoria, Diop lista várias rainhas guerreiras africanas que participavam ativamente das questões públicas e políticas, em oposição às mulheres indo-europeias, subjugadas pelo poder masculino. Na Etiópia, a rainha de Sabá expressa o poder feminino desde os tempos primordiais. A rainha Candance, que lutou contra o exército invasor de Augustus César. No Egito, a rainha Hatshepsout, descrita como “a primeira rainha na história da humanidade”. Cleópatra, chamada “Rainha dos Reis”. Até mesmo no enorme e poderoso império de Gana, no século III, os valores matriarcais eram a norma. Isso vale para o poderoso Império do Mali, que se apoiava nas instituições matrilineares.

Para Diop, a mudança do matriarcado para o patriarcado em África se deve primariamentea fatores externos. A patrilinearidade na África está associada à chegada do Islã no século X. O Islã, o Cristianismo e a presença dos europeus na África, simbolizada pela legislação colonial, direito sobre as terras, nomeação segundo a família do pai, monogamia e a educação ocidental das elites são fatores externos que levaram ao patriarcado.

As mulheres sempre moveram as sociedades africanas. Há vários exemplos de rainhas, governantes, guerreiras que foram determinantes para a História da África. Ficou famosa a Rainha Njinga Mbandi, que assumiu o poder dos reinos de Ndongo  Matamba (atual Angola) no século XVII e lutou contra os portugueses por mais de quatro décadas por sua autonomia, sem jamais ter sido reduzida à vassalagem. No século XVIII, foram várias mulheres que governaram sob o título “Rainha Jinga” e prosseguiram defendo seus territórios de forma aguerrida.


Entre os Akan, povos da atual República de Gana, há a existência da "Omahene”, cargo político ocupado por uma mulher que detinha verdadeiro poder político. Estas podiam, em certas circunstâncias, assumir o total controle da autoridade política. Segundo Farrar, os Akan possuíam um poder político partilhado que se expressa pelas hierarquias políticas paralelas de homens e mulheres.

Os Bijagós, na atual Guiné-Bissau, são exemplo de matriarcado que perdurou até o século XX, em que as mulheres teriam controle sob a unidade doméstica e o trabalho, proporcionando a subsistência das aldeias. A Rainha Pampa de Orango Grande assumiu o poder no final do século XIX e ficou conhecida por sua longeva chefatura, pela resistência armada às investidas portuguesas e pela manutenção de uma “paz” dentro de sua sociedade. O matriarcado entre os Bijagós é marcado pela descrição das “liberdades das mulheres” nas relações conjugais – a escolha do marido, a possibilidade do divórcio e as relações poliândricas – e pela centralização da economia sob poder das mulheres.


** Adaptado da internet

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