A migração do Saara em direção ao Vale do Hapi (Nilo)

É geralmente aceito que, por volta de 7000 a.C., o Sahara tinha secado. A Afrika Equatorial era provavelmente ainda uma zona de floresta muito densa para atrair os homens. Conseqüentemente, os últimos Pretos que viviam na Sahara agora presumivelmente o deixaram migrando em direção ao Alto Nilo, com a possível exceção de alguns pequenos grupos isolados no resto do continente, que ou haviam migrado para o sul ou tinham se dirigido para o norte 

O que nós encontramos no Sahara mostra que foi habitada por Negros: .. “Camponeses Negros, inumerável bois, campos de painço, panelas feitas de terracota, peixe fresco, uma abundância de atividades, uma paisagem verde, e canoas solidamente construídas, tudo muito bem. Mas isso não era para durar. O período úmido havia sido precedido por um interlúdio quente, estéril, que seria gradualmente substituído por uma nova dessecação.O deserto reconquistou seu reino, drenando lagos, secando grama, obliterando o campo. e o que dizer das pessoas? Tempos difíceis para eles e sérios debates no Parlamento: deviam eles permanecer lá e deixar­se morrer, ou migrar ou adaptar? Ninguém optou pelo suicídio, a adaptação não conseguiu um único voto, a escolha unânime foi o êxodo".

Esqueletos pré-­históricos encontrados no deserto do Saara são do tipo Negro: o homem Asselar, ao sul do Saara. Talvez o primeiro grupo encontrou uma população Preta indígena na região do Alto Hapi (Nilo), Seja qual for o caso, foi a partir da gradual adaptação às novas condições de vida as quais a natureza permitia a essas várias populações Pretas que o mais antigo fenômeno de civilização surgiu. Esta civilização, chamada Kemet-Egito em nosso período, desenvolveu-­se por um longo tempo em seu primitivo berço; em seguida, ela desceu lentamente o Vale do Hapi (Nilo) para se espalhar em torno da bacia do Mediterrâneo.

Este ciclo de civilização, a mais longa da história, provavelmente durou 10.000 anos. Este é um compromisso razoável entre a longa cronologia (com base em dados fornecidos por sacerdotes Kemeticos, Heródoto e Manetho que colocam o início por volta de 17.000 a.C.) [nota, * Manetho de Sabennytos, um sacerdote Kemético (século III a.C.), que escreveu uma crônica sobre Kemet em Grego] e a curta cronologia dos modernos – pois os últimos são obrigados a admitir que por 4235 a.C. os Kemeticos já haviam inventado o calendário (o que requer, necessariamente, a passagem de milhares de anos). Obviamente, durante esse longo período, os Pretos poderiam ter penetrado mais e mais para o interior do continente para formar núcleos que se tornariam centros da civilização continental. 

Essas civilizações Afrikanas seriam isoladas do resto do mundo. Eles tenderiam a viver em isolamento, como resultado da distância enorme separando­-os das rotas de acesso para o Mediterrâneo. Quando Kemet perdeu a sua independência, o seu isolamento foi completo. A partir de então, separados do país materno que foi invadido pelo estrangeiro, e retirados em um ambiente geográfico exigindo um mínimo de esforço de ajustamento, os Pretos eram orientados para o desenvolvimento de sua organização social, política e moral, ao invés de em direção de especulativa investigação científica que suas circunstâncias não justificavam, e até mesmo impossibilitavam. 

A adaptação ao fértil Vale do Hapi (Nilo) necessitou técnicas especialistas em irrigação e barragens, cálculos precisos para prever as inundações do Rio Hapi e para deduzir as suas conseqüências econômicas e sociais. Ela também necessitou a invenção da geometria para delimitar a propriedade após as inundações obliterando linhas de fronteira. Da mesma forma, o terreno em longas e planas tiras necessitou a transformação da enxada paleo­Negritica em um arado, primeiramente traçado por homens, e posteriormente por animais. 

Indispensável como tudo o que havia para a existência material do Negro no Vale do Hapi (Nilo), tornou-­se igualmente supérfluo nas novas condições de vida no interior. Desde que a história havia interrompido seu antigo equilíbrio com o meio ambiente, o Povo Preto agora encontrou agora um novo equilíbrio, que difere do primeiro, na ausência de uma não mais vital técnica para a organização social, política e moral. 

Monarquias já eram constitucionais, com o Conselho do Povo no qual os diversos estratos sociais eram representados. Ao contrário da ‘lenda’, o rei Negro não era, e nunca foi, um déspota com poderes ilimitados. Em alguns lugares, ele era investido pelo povo, com o Primeiro-­Ministro, um intermediário representando os homens livres. Sua missão era servir o povo com sabedoria e sua autoridade dependia de seu respeito pela constituição estabelecida.


- Cheikh A Diop

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