Escrito por Cheikh Anta Diop
(Traduzido por Abibiman Kandace)
Segundo o pensamento Egípcio, o Ser se compõem de três princípios (Platão, Aristóteles...), aos quais podemos adicionar um quarto: a sombra.
1° O zed ou khet, que se decompõe após a morte.
2° O ba, que é a alma corporal (o "outro" do corpo no resto da África Negra).
3° A sombra do ser.
4° O ka, princípio imortal que se reúne com a divindade no céu depois da morte. Assim se estabelece, no plano ontológico, a imortalidade do ser (três mil anos antes do nascimento das religiões reveladas). Cada homem possui uma parcela da divindade que preenche o cosmo e o faz inteligível ao espírito. É talvez neste sentido que a cosmogonia Egípcia faz Deus dizer "que fez o homem a sua imagem [e semelhança]".
Enfim, digamos que a ogdóade hermopolitana se compõem especificamente de quatro casais divinos que representam os princípios opostos da natureza, e que estariam na origem de todas as coisas*.
Kuk e Kuket: as trevas primordiais e seu oposto, as trevas e a luz.
Nun e Nunet: as águas primordiais e seu oposto, a matéria e o nada.
Heh e Heket: o infinito espacial e seu oposto, o infinito e o finito, o ilimitado e o limitado.
Amon e Amonet: o oculto e o visível, o divino e o fenômeno.
Niaw e Niawet: o vazio e seu oposto, o vazio e o cheio, a matéria (mais tarde).
Vimos como se pode construir o universo a partir destas noções que estarão também na base da filosofia ocidental e, em particular, do pensamento dialético.
À luz desta breve exposição, isso só traz o assunto à tona, se pode ponderar tudo o que a filosofia grega deve ao pensamento Egípcio dos Negros do Vale do Nilo: a teoria dos contrários de Heráclito, a dialética de Aristóteles, as diversas cosmogonias dos filósofos pré socráticos...
* Os casais se formam com cada nome da divindade associado ao mesmo nome com a desinência feminina: as formas masculinas costumam ser representadas com uma cabeça de sapo, enquanto as femininas se representam com uma cabeça de serpente: seu significado é variável e complexo (tal como aponta, por exemplo, a iconografia de Heket como um falo prolongado em uma serpente); a ogdóade influenciou posteriormente no gnosticismo e o pensamento esotérico cristão. Embora os quatro casais se entendam como uma unidade, condensado em Djehuty-Tot (em algumas fontes se fala da "alma de Tot"), ao mesmo tempo conformam uma sequência lógica, porém também de certo modo "cronológica". Os três primeiros casais aparecem em todas as versões da teologia hermopolitana e normalmente a ordem é Nun/Nunet, Heh/Heket, Kuk/Kuket; o quarto casal é objeto de variações, predominando finalmente o casal Amon/Amonet, embora pareça que anteriormente o havia precedido Niaw/Niawet (também escrito como Nia/Niat), nomeada ou substituída por Tenemu/Tenemut ou Ghereh/Gheret, antes de ser deslocada pela denominação Amon/Amonet. Duas variações da cosmogonia: após a emersão da colina primitiva das águas primordiais, a ogdóade se instala ali onde um ganso (mais tarde um Ibis, animal de Tot ao lado do babuíno) deposita um ovo de onde virá Ra (mais tarde Atom-Ra), o demiurgo criador da organização do desorganizado que permitem os quatro casais; na segunda versão, o demiurgo é Horus da manhã, que surge de uma flor de lótus que flutua sobre as águas primordiais. Nos dois casos, a ogdóade se instala no mundo subterrâneo após a criação, permanecendo em repouso, porém regulando alguns fenômenos elementares (como o nascer do sol ou as enchentes do Nilo), como forças primordiais sem forma.
Cheikh Anta Diop. Civilização e barbárie. Páginas 400 e 401. Baixe aqui.
Algumas considerações:
Kemet significa “Terra dos Negros” na língua Medu Neter. Esse é o nome original para o Antigo Egito.
Khmun é o nome Kemético original da cidade de Hermópolis.
Na teologia de Khmun, Hemenu era o conjunto de oito divindades. Ogdóade é um termo de origem não-Afrikana.
Hapi é o nome kemético para o rio Nilo.
Heru é o nome original do Deus Hórus.
Agradecimentos especiais para Carlos Augusto (pai de Nia) que colaborou com a tradução do espanhol.
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