Os textos dos viajantes Portugueses, citados por Frobenius, concordam com os de autores Árabes do século X ao século XV. A organização social dos Estados Negros nos séculos XIV e XV, a que se refere Frobenius, a pompa real exibida lá, são descritas por um escritor Árabe que visitou o Império do Mali na época. Esta é uma passagem em que Ibn Battuta relata audiências concedidas pelo Rei Mandingo, Suleyman Mansa. O autor visitou o Sudão em 1352-1353, na época da Guerra dos Cem Anos...
Em certos dias, o sultão mantém audiências no pátio do palácio, onde há uma plataforma debaixo de uma árvore, com três degraus; esta eles chamam de pempi. Esta é coberta de seda e tem almofadas colocadas nela. Sobre ela é levantada a sombrinha, que é uma espécie de pavilhão feito de seda, encimado por um pássaro em ouro, mais ou menos do tamanho de um falcão. O sultão sai de uma porta em um canto do palácio, carregando um arco na mão e uma aljava em suas costas. Em sua cabeça, ele tem um solidéu dourado, preso com uma faixa de ouro que tem extremidades estreitas em forma de facas, com mais de um palmo de comprimento. Seu traje usual é uma túnica vermelha aveludada, feita dos tecidos Europeus chamados mutanfas. O sultão é precedido por seus músicos, que carregam guitarras de ouro e de prata de duas cordas, e atrás dele vêm 300 escravos armados. Ele anda em uma forma vagarosa, afetando um movimento muito lento, e até mesmo pára de vez em quando. Ao chegar ao pempi ele pára e olha em torno da assembléia, em seguida, sobe nele da maneira calma como um pregador sobe em um púlpito-de-mesquita. Assim que ele toma seu lugar os tambores, trompetes, e cornetas e são tocados. Três escravos saem correndo para chamar os adjuntos e militares comandantes do soberano, que entram e se sentam. Dois cavalos selados e com rédeas são apresentados, juntamente com duas cabras, que eles detém para servir como uma proteção contra o mau-olhado. Dugha fica no portão e o resto do povo permanece na rua, debaixo das árvores. Os Negros são, entre todos os povos, os mais submissos ao seu rei e os mais abjetos em seu comportamento perante ele. Eles juram pelo nome dele. * [* - Ibn Battuta, op. cit., pp. 25-26. Isto é citado de Ibn Battuta, Travels in Asia and Africa (Ibn Battuta, Viagens na Asia e África), de Gibb. London, 1929, pp. 326-327.]
Ibn Battuta à seguir nos diz que Kankan Musa, antecessor de Suleyman Mansa, tinha dado a Es Saheli, quem construiu uma mesquita para ele em Gao *, cerca de 180 kg (cerca de 400 libras) de ouro. Isso nos dá uma idéia da riqueza do país no período precolonialista. [ * - Gao, antiga cidade mercante no Médio Níger, capital do Império de Songhai]
Outra passagem por Ibn Battuta destrói a lenda de que a insegurança reinava na África Preta antes da colonização Européia e que esta colonização trouxe consigo paz, liberdade, segurança, e assim por diante.
Entre as admiráveis qualidades dessas pessoas, o seguinte deve ser notado:
1. O pequeno número de atos de injustiça que se encontra aqui; pois os Negros são de todos os povos os que mais abominam a injustiça. O sultão não perdoa ninguém que seja culpado disso.*
2. A completa e geral segurança que se goza por toda a terra. O viajante não tem mais razão para temer bandidos, ladrões, ou raptores do que o homem que fica em casa.
3. Os Pretos não confiscam os bens do homem branco [isto é, de Norte-Africanos] que morrem no seu país, nem mesmo quando estas consistem em grandes tesouros. Eles, pelo contrário, os depositam com um homem de confiança entre os Brancos até aqueles que aqueles que têm o direito aos bens se apresente e tome posse. ** [* - Este Testemunho de Ibn Battuta confirma o que os antigos (Heródoto, Diodoro, et al.) nos ensinaram sobre as virtudes dos Etíopes.] [** - Op. cit., p. 36. Traduzido por Basil Davidson, do Francês de C. Dpefremery & B.R. Sanguinetti, no The African Past (O Passado Africano), p. 82.]
Nesse período, como é que os Pretos se conduziam na presença de Brancos, ou de raças consideradas brancas? Ibn Battuta responde a esta pergunta em um texto descrevendo a recepção de sua caravana em Walata onde o Farba Hosein representou o Rei de Mali:
Nossos comerciantes ficaram em sua presença e ele dirigiu-se através de uma terceira pessoa, embora eles estivessem de pé perto dele. Isto mostrou o quão pouca consideração ele tinha por eles e Eu estava tão ofendido que amargamente me ressentia de ter vindo para um país cujos habitantes se mostram tão descortêses e evidenciam tal desprezo por homens brancos. * [ * - Op. cit., p. 10.]
Delafosse, cujo comentário sobre a importância do Império de Mali foi citado anteriormente, observou: "Gao, no entanto, tinha recuperado a sua independência entre a morte de Kankan Musa e o advento do Suleyman Mansa e, cerca de um século mais tarde, o Império Mandingo começou a declinar sob ataque do Songhay, embora conservando suficientes energia e prestígio para que o seu soberano negociasse de igual para igual com o Rei de Portugal, que estava então no auge de sua glória.". * [ * - Delafosse, Les Noirs de l‟Afrique (Os Negros da África) p. 62.]
Por conseguinte, os imperadores da África Preta, longe de ser meros régulos, negociaram em pé de igualdade com os seus mais poderosos homólogos Ocidentais. Na força de documentos em nossa posse, podemos ir mais longe e enfatizar o fato de que os impérios neo-Sudanês precederam por vários séculos a existência de impérios comparáveis na Europa. O Império de Gana, provavelmente, foi fundado sobre o terceiro século d.C. e durou até 1240. Como sabemos, Carlos Magno, fundador do primeiro Império do Ocidente, foi coroado em 800.
A Magnificência de Gana foi em todos os aspectos, semelhante ou superior a de Mali. Tais, então, eram os Estados Africanos no momento em que estavam prestes a entrar em contato com o mundo Ocidental moderno. Naquela época havia apenas monarquias absolutas no Ocidente, enquanto que na África Preta as monarquias já eram constitucionais. O rei era auxiliado pelo Conselho do Povo, cujos membros eram escolhidos de entre os diversos estratos sociais. Este tipo de organização existia em Gana, Mali, Gao, Yatenga, Cayor e assim por diante. Isso não poderia ter sido o início, mas sim o resultado de uma longa evolução, o início da qual nós só podemos descobrir voltando para Núbia e Egito. De nenhuma outra maneira podemos restabelecer a continuidade dessa corrente. Por qualquer lado que a história da África seja considerada, constantemente se recai sobre o Sudão Meroítico e Egito.
Cheikh Anta Diop, A origem Africana da civilização. capítulo 7 Argumentos opondo-se a uma origem Negra, páginas 334 a 339.
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