Unidade linguística do idioma Kemetico e do idioma wolof

 Idiomas 


É tão fácil provar a profunda unidade entre os idiomas Egípcio e Negros quanto é difícil sustentar - e muito menos provar - o parentesco entre as línguas Egípcia, Indo-Européia, e Semíticas. "Um jovem estudioso, N. Reich, decidiu comparar certas raízes Egípcias com algumas outras ainda usadas pelas populações Negras da África Central e Núbia. Ele mostrou sem dificuldade que elas eram absolutamente idênticas ". (Amélineau, Prolégomènes, p. 216.)

 Após Reich, a Senhorita Homburger [Miss Homburger] [Professora de línguas Africanas em Paris] sustenta a relação entre as línguas Egípcia e Negro-Africanas no Capítulo XII de seu Les Langues Negro-africaines [As Línguas Negro-Africanas] (Paris: Ed. Payot, 1941). Mas sua tese implica meramente uma influência Egípcia sobre um substrato Negro, que originalmente poderia ter sido étnica e linguisticamente diferente do substrato Egípcio. Dando aos estudos da Senhorita Homburger a importância recusada a eles até agora, Eu a achei difícil para concordar neste último ponto. A quase identidade do Egito e da África Preta, em todos os aspectos, étnicos e outros, não justifica sua conclusão [a conclusão da Senhorita Homburger].

 A comparação linguística entre Egípcio e Wolof a qual, embora limitada, será mais convincente por causa de sua precisão, irá refutar a noção de duas origens linguísticas diferentes. À priori alguém poderia achar uma tal comparação impossível, por alegar que em 2000 anos o Latim foi tão completamente transformado em outros idiomas: Francês, Espanhol, Italiano, etc., que seríamos incapazes para relacionar essas línguas a ele [Latim] se nós não tivéssemos testemunho anteriormente escrito.

 Por duas razões, esta observação não me intimidou: Em primeiro lugar, a evolução das línguas, em vez de avançar em todos os lugares com a mesma taxa de velocidade, parece ligada a outros fatores, tais como: a estabilidade das organizações sociais, ou o oposto, convulsões sociais. Compreensivelmente, em sociedades relativamente estáveis, a linguagem do homem mudou menos com a passagem do tempo. Isso não é simplesmente hipótese: as vinte frases Berberes disponíveis, que remontam ao século XII, revelam uma linguagem idêntica com o Berbere moderno, ao passo que uma comparação entre o Francês dos primeiros Capetianos [1000 anos atrás] e o Francês moderno revela diferenças profundas.

Na África Preta propriamente, a escassa evidência que nós temos daquelas línguas anteriores, à exceção do Meroítico ainda não decifrado, dadas ao estado atual de nosso conhecimento, consistem em poucas palavras díspares em textos de autores Árabes do século X ao século XV. Assim, nós lemos nas Voyages au Soudan [Viagens ao Sudão] de Ibn Battuta (p. 15): "O guerti é um fruto semelhante à ameixa com um sabor muito doce; mas este não é saudável para os Brancos. Seu núcleo é esmagado para extrair o óleo.”

A palavra guerté deve ter sido aplicada ao amendoim no momento da sua introdução recente na África Preta. Se nós considerarmos a forma Wolof da palavra, a qual deve ter sido tomada emprestada a partir do Sarakolé, e se aceitarmos a ortografia de Ibn Battuta como acurada, a palavra atual (guerté) difere do termo do século XIV (guerti) apenas na mudança da vogal final.

 "Os Brancos que professam a doutrina Sunita e observam o ritual Malekita, são chamados de "Touri" aqui", diz Ibn Battuta (p. 17). Touré é um nome Sudanês. Assim, os Touré foram provavelmente raças-misturadas, parcialmente descendendo da minoria Árabe no Sudão durante o século XIV. Semelhantemente, ele se refere à Farba Hosein de Valata. Hosein, um termo Árabe, foi corretamente escrito pelo autor. Na transcrição, Valata tornou-se Valaten, que parece refletir uma terminação Berbere. Com esta exceção, a estrutura e a pronúncia da palavra permaneceram as mesmas. Farba designa uma função administrativa em Serer e foi incorporada na íntegra em Wolof. "O Rei de Gana era chamado de Maga", uma palavra provavelmente tão antiga quanto o terceiro século antes de Cristo, como a língua Sarakolé se podermos supor que esta era falada no início deste império.

Como já observado, Mag= grande, uma grande pessoa, em Wolof, enquanto que Ganâr indica a atual Mauritânia, isto é, o noroeste do antigo império de Gana. Killa= cabaça (no século XIV); Atualmente, em Wolof, isso [Killa] significa utensílio de madeira. Esses poucos exemplos mostram a estabilidade relativa das línguas Africanas.

 Em segundo lugar, a comparação das línguas Africanas com o Egípcio não leva a relacionamentos vagos que podem no máximo ser considerados como possibilidades, mas sim a uma identidade de fatos gramaticais numerosos demais para ser atribuída ao acaso. Consequentemente, nós temos aqui um fenômeno semelhante àquele que há alguns anos atrás confrontou o mundo físico-químico na lâmpada incandescente. Recusar-se a examinar esses fatos concretos e a procurar uma explicação para eles é não-científico. Em vez disso [ao invés de ser científica], esta atitude é inteiramente análoga àquela dos filósofos eruditos que, vendo o filamento daquela lâmpada se tornar intermitentemente incandescente, ainda assim concluíram que o fenômeno era uma impossibilidade, porque este era contrário aos princípios aceitos até aquele momento, contrário às convicções previamente mantidas por eles.

 Podemos nós simplesmente ignorar semelhanças tais como as seguintes? O Egípcio expressa o pretérito pelo mesmo morfema, n, como o Wolof; ele tem uma conjugação sufixal que reaparece na íntegra em Wolof; a maioria dos pronomes são idênticos àqueles em Wolof. Nós encontramos os dois pronome sufixos Egípcios, ef e es, com o mesmo significado em Wolof; os demonstrativos são os mesmos em ambas as línguas; a voz passiva é expressa pelo mesmo morfema, u ou w em ambas as línguas . . . É o suficiente substituir o n em Egípcio pelo l em Wolof para transformar uma palavra Egípcia em uma palavra Wolof com o mesmo significado:


Sem listar todo o vocabulário comum a ambos, existem muitas semelhanças para serem atribuídas a um mero acaso.


Cheikh Anta Diop, A origem Africana da civilização. capítulo 7 Argumentos suportando uma origem Negra,  páginas  319 a 323.

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